28 setembro 2008

Guardião de memórias

Aquela foto nos revelou: distantes, desconhecidos, embora, amantes.
Mãos entre as pernas, sorriso constrangido, nem parece marido.
O coração bate forte, é o medo do flash.
O guardião de memórias não revelou, porém, o ciúme.
Escancarado com a implicância incomum.
Não revelou o carinho apertando a mão, apertava o peito também.
Não revelou a vontade de estar perto.
Não revelaria a vontade de dizer que ama demais aquela companhia.
Que no dia seguinte o telefone tocaria.
E, sem pensar, ambos se entregariam ao carinho dos abraços.
Sem saber quando seria a próxima vez.
Por isso, se amariam como se fosse a última.
Nestes encontros, alguém sempre quer colocar o ponto final:
Nas angústias, medos, fofocas, dores...
Alguém sempre quer mais prazer.
É uma relação desigual, ambos sabem.
Mas falar pra quê?
Materializar jamais.
Deixemos as dores noutros quartos.
Não num quarto de motel.

22 setembro 2008

Amarra o teu arado a uma estrela

Gil

Se os frutos produzidos pela terra
Ainda não são
Tão doces e polpudos quanto as peras
Da tua ilusão
Amarra o teu arado a uma estrela
E os tempos darão
Safras e safras de sonhos
Quilos e quilos de amor
Noutros planetas risonhos
Outras espécies de dor

Se os campos cultivados neste mundo
São duros demais
E os solos assolados pela guerra
Não produzem a paz
Amarra o teu arado a uma estrela
E aí tu serás
O lavrador louco dos astros
O camponês solto nos céus
E quanto mais longe da terra
Tanto mais longe de Deus

19 setembro 2008

Dedilhar as costas, massagear os pés, morder as pernas, abraçar apertado, olhar com os olhos fechados

- Respira...respira...

04 setembro 2008

Castelos

A saudade hoje chegou bem cedo, antes mesmo do café e do jornal. Pensei em você e senti nosso cheiro no ar. Sua voz, quase real, me chamou e repetiu, baixinho, palavras que me fizeram estremecer. O vazio gelado me trouxe, então, a vontade louca de correr para você.

Incitando minha agonia, as horas quase correram para trás. Dei mais corda no velho relógio da sala, na tentativa frustrada de fazer acelerar o dia. Por fim, venci o tempo, os contra tempos, desintegrei minha decência, abri portas que não devia e destruí paredes para estar ao seu lado.

A intenção era surpreender e bati de frente com a realidade: você não me esperava. Então me dei conta de que sua vida segue sem mim. Voltei os quilômetros percorridos com um bolinho nas amídalas e a certeza de que os castelos imaginados são bem mais coloridos que os de verdade.

É! Talvez não deva mais construir castelos. Mas se um dia voltar a fazê-lo, cuidarei para usar menos lápis de cor.

Ju


* Uma homenagem a sumida Ju, que escreve com honestidade os pensamentos femininos. E com este texto expressa os meus.