27 março 2007

Ossos do ofício

Quando o carro da redação encostou, parecia que a seleção brasileira havia feito um gol na Copa do Mundo contra a França. Eles gritavam de felicidade, pulavam, batiam palmas. Assustei-me. Também tive a certeza de que não se tratava de um assassinato, como acreditava inicialmente, tamanho a aglomeração. Eles achavam que estávamos ali por causa deles, mal sabiam que passávamos no local por acaso. Queríamos mesmo era chegar logo à redação. Mas o desejo por um furo movia a todos que ocupavam o carro. Por isso paramos.
Em meio a fumaça do mato queimado, desci do carro. Aos primeiros passos fui cercada por inúmeras pessoas que se atropelavam para falar, eu não conseguia entender nada! - Calma, calma! Contem o que aconteceu do início, por favor! A triste história foi aos poucos se delineando. Uma menina de 11 anos havia morrido depois de ser atropelada às margens da BR 040, quando tentava voltar para casa, na comunidade Sol Nascente, em Luziânia. Nós do jornal voltamos de uma outra pauta mais próximo do centro. Várias comunidades beiram essa BR. A Sol Nascente fica de um lado da estrada e a Ostaya fica do outro lado, só a primeira tem escola para crianças e jovens do local. Motivo que gera a necessidade dos moradores atravessarem constantemente a BR, que não dispõe de nenhum redutor de velocidade.Os moradores reivindicavam barreiras eletrônicas.
Depois que apurei o ocorrido, vou à casa da vítima. Precisava do nome completo da menina. Ligo para meu editor e conto a história, ele pondera que o jornal já está quase todo fechado, que não precisava investir na pauta. Mas já estou a caminho da casa dos familiares. Desconsolados eles tem dificuldade de falar e eu de perguntar. A avó da menina, que estava de mãos dadas com ela na hora da tragédia, trazia nas mãos o nome da menina. Escrito num material utilizado para decorar escolas e materiais escolares, ou mesmo lembrancinhas de aniversário. As letras demonstram uma certa dificuldade com a caligrafia. Talvez escrito pela própria vítima e arrancado as pressas de algum lugar no qual estava colado. O papel ainda trazia a cola ao fundo. Cinco linhas, foi o suficiente para a matéria ocupar o pé da página no jornal. O nome da menina? Wesllyane Cristine da Silva Nascimento.

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